Entrevista com Birgit Weyhe, que autografa
"Osmose" neste sábado, na Feira do Livro: "São Paulo não é
representativa do Brasil"
Livro é produto do intercâmbio de seis autores alemães e
brasileiros entre os dois países
Por Cristina Duarte
A quadrinista alemã Birgit Weyhe autografa, junto com a
gaúcha Paula Mastroberti, o livro Osmose, às 20h deste sábado na Praça de
Autógrafos. A obra é resultado da experência de seis artistas, três
brasileiros e três alemães. em projeto coordenado pelo Instituto Goethe em
parceria com a Editora Libretos. Os brasileiros foram enviados cada um para uma
cidade diferente da Alemanha – Paula foi para Berlim – e os alemães vieram
cada um para uma metrópole do Brasil. Antes da sessão de autógrafos, às
18h30min, as duas autoras conversam sobre a experiência no Centro Cultural CEEE
Erico Verissimo.
Na HQ Dez Verdades Sobre São Paulo, Birgit retrata uma
cidade que acolhe com amabilidade os turistas e estrangeiros, mas deixa a
desejar quando se trata das diferenças sociais e raciais. Apesar das dificuldades
de comunicação, o intercâmbio de um mês na capital paulista aflorou na alemã a
vontade de conhecer outros lugares do Brasil. Além da história em quadrinhos,
os participantes do projeto deveriam publicar em umblog.
Zero Hora –
Quais foram as dificuldades que você encontrou durante sua estada em São Paulo?
Birgit Weyhe – Na verdade, eu tive menos dificuldades
do que esperava. São Paulo é uma metrópole muito cosmopolita, com pessoas muito
amáveis. Não vi ou tive contato com nenhum tipo de crime ou ameaça (mas tenho
de admitir que eu não visitei os bairros realmente pobres da periferia). No
entanto, visitei muitos lugares e sempre usei o transporte público. As pessoas
são muito prestativas e me informaram sobre qual ônibus ou metrô usar. Eu
gostaria que as pessoas na Alemanha pudessem ser um pouco mais assim. Mas tive
que me acostumar com o trânsito – que é bem diferente no Brasil. Como
pedestre, sempre me senti como um coelho caçado. E o barulho e a poluição eram,
às vezes, bem irritantes. Nada muito sério, contudo.
ZH – Você ficou
receosa de ir para um lugar onde, além das diferenças culturais, havia o
problema do idioma?
Birgit – Antes de partir para São Paulo eu tinha um
pouco de medo das altas taxas de criminalidade, sobre as quais havia ouvido
muita coisa. Imaginava se seria difícil me orientar em uma cidade tão grande.
No fim, não tive nenhum problema em ambos os casos. Até caminhei sozinha à
noite até o metrô ou a lugares próximos, e não tive nenhuma sensação de
insegurança. Com o idioma eu não estava muito preocupada, porque achava que
conseguiria me virar falando inglês e um pouco de espanhol. Não foi o caso. Eu
achei de fato difícil me comunicar, e com frequência me senti triste por não conseguir
articular minhas impressões. Mas devido à simpatia das pessoas, sempre
consegui, de algum modo, dar um jeito – ao menos nas compras, nos
restaurantes, no transporte público, etc. O que me ajudou muito foi o fato de
eu haver crescido no leste da África e só ter vindo para a Europa com 18 anos.
Então, estou acostumada a me adaptar a novos lugares. Eu me senti imediatamente
em casa em São Paulo, porque conhecia todas as plantas da minha infância. Por
isso, estou muito feliz de encontrar minha árvore favorita outra vez, o
Jacarandá. Estou encantada com o fato de que eles estão florindo por toda parte
em Porto Alegre nesta época.
ZH – Como foi o
processo de produção da HQ?
Birgit – Durante minha estada em São Paulo, eu
normalmente separava meu dia em dois: metade do tempo eu visitava lugares e
caminhava pela cidade, e a outra metade eu desenhava para o blog. Li muito e
visitei museus, comprei um monte de livros sobre o Brasil e entrevistei todas
as pessoas que encontrei no Goethe Institut (eram os brasileiros que conseguiam
se comunicar comigo em alemão). Fiz um monte de anotações e escrevi a história
e fiz o storyboard nos meus últimos dias no Brasil. Quanto mais tempo eu ficava
no país, mais eu tinha a sensação de quão pouco eu sabia. Foi por isso que dei
o título de Dez Verdades Sobre São Paulo. Depois de quatro semanas lá, eu
me sentia bem longe de saber alguma coisa sobre a cidade.
ZH – Você
conseguiu captar a essência e as contradições do povo brasileiro em sua
história. Elas pareceram de algum modo estranhas para você?
Birgit – Sim, de fato. Em um dia, eu tinha certeza de
haver entendido algo essencial sobre o país ou a sociedade e no dia seguinte eu
tinha a impressão completamente oposta. No fim, aceitei que essa era uma das
coisas essenciais do lugar – a ambiguidade. E isso também foi fascinante.
Eu tinha a sensação muito forte de o quanto esta sociedade ainda está mudando.
De que ainda há tanto potencial, tão poderoso. Comparada com a Europa, onde tudo
é tão claramente definido e estabelecido por tanto tempo, foi uma experiência
muito intensa.
ZH – Quais são
suas impressões finais após um mês no Brasil?
Birgit – Minha impressão final é de que eu tenho de
voltar e viajar muito pelo país. Porque, por tudo o que ouvi, São Paulo não é
representativa do Brasil. E depois de tudo o que experimentei, eu
definitivamente quero aprender mais, ver mais, saber mais. Então agora tenho
três dias em Porto Alegre, mas eu vou voltar cedo ou tarde, com muito mais
tempo.
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