“O escritor é um monstro moral,” já disse
Dalton Trevisan, fazendo-nos pensar em uma das funções da literatura. “Elemento
negativo da cultura”, conforme Teixeira Coelho, a arte serve para revirar,
arejar, constituir-se em algo que instaura insegurança para a “doxa”, para as
opiniões formadas, seguras. É isso o que pensa (e faz) também a Vaca Azul é
Ninja, personagem surrealista e iconoclasta de Jéferson Assumção, representação
irônica de um tipo de intelectual em crise no nosso tempo.
O escritor Luiz Antonio de Assis Brasil, no
texto de apresentação, fornece algumas pistas sobre o perfil da protagonista
“... a Vaca Azul, irreverente, brilhante, incombustível, dedica sua liberdade
vacum para bagunçar a cultura estabelecida e vergastar (às vezes, literalmente)
o nosso mundo e horrorizar seu interlocutor Jey Jey”, descreve Assis Brasil.
Para Jéferson Assumção, a realidade está se
transformando com tanta velocidade que um certo tipo de intelectual (e talvez
de artista) encontra-se muitas vezes perdido, trocando em muitas situações os
pés (ou as patas, no caso da Vaca) pelas mãos, de maneira até mesmo violenta a
tentar entender o que ocorre ao seu redor. "Nessa época de transformações
profundas na legitimação do artístico e do conhecimento formalizado e
sistemático, seu distanciamento da realidade, ou do senso comum, poderia ser
pensado não apenas como inadequação ao mundo, mas até mesmo como um
distanciamento vital dele, abstrato, artificial: uma vida entre aspas. É o que a Vaca Azul é Ninja simboliza",
observa.
Esta narrativa literária com ares de
história em quadrinhos, com muitas situações divertidas, trabalha com o
alegórico parodiando ainda clássicos da Filosofia e da Sociologia. Provocativo,
o livro convida constantemente o leitor a fazer alguns questionamentos, como no
trecho reproduzido a seguir: “Contra a falsidade do mundo, o que o escritor faz
não é ficção – A Vaca Azul pensava, e a porrada comendo –, faz a realidade à
medida que investe contra as convenções, num trabalho que Hegel chamaria de ver
o mundo ‘pelo avesso’. Daí a
dignidade da indignação, do esperneio, da inconformidade, daquele que quer
desvelar este mundo de mentiras, revelar o funcionamento do teatro, em vez de
vivê-lo". Abstrata, possível fruto da loucura do
narrador, A Vaca Azul é Ninja usa a violência, a ironia e as artes marciais
para atacar (teórica e literalmente) a sociedade contemporânea. O livro propõe
uma reflexão sobre o momento atual, em que a sociedade repensa valores. E todos nós estamos incluídos nesta metáfora,
podendo até sermos as vítimas das artes místicas e guerreiras do antigo Japão,
praticadas pela Vaca Azul, a serviço do que ela acredita ser o verdadeiro, o
bem e o belo.
A obra, licenciada pelo autor via Creative
Commons, integra a Série Libretos Poche
(Livros de Bolso) e tem lançamento no dia
31 de julho, às 19h, na Pinacoteca Bar - Rua da República, 409 - Cidade Baixa.
Jéferson Assumção é autor de mais de 20
livros, entre novelas infantojuvenis, livros de ficção e de filosofia. Desde
2011, é secretário-adjunto de Cultura do Estado do Rio Grande do Sul. Foi
secretário municipal de Cultura de Canoas e coordenador-geral de Livro e
Leitura, no Ministério da Cultura. Formado em Filosofia, doutorou-se em León,
Espanha, com tese sobre a obra do filósofo espanhol José Ortega y Gasset
(1883-1955).
A Vaca Azul é Ninja em uma vida entre aspas
Jéferson Assumção
Série Libretos Poche -
Livros de Bolso
2014, 120 p., 12cm x
17cm
R$25,00 (no
lançamento, R$20,00)
31 de julho, às 19h
Pinacoteca Bar - Rua
da República, 409 - Cidade Baixa
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